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Os Cristãos e os Transtornos Mentais (final)

  • teleswork
  • 31 de jan. de 2024
  • 5 min de leitura

Na última parte da nossa série de estudos sobre os Cristãos e os Transtornos Mentais, abordaremos alguns estigmas e tabus que tanto a igreja quanto as famílias ainda sustentam e que se aumentam as dificuldades para aqueles que sofrem com problemas emocionais, visto que o medo de ser estigmatizado é um dos principais obstáculos para os cristãos buscarem ajuda especializada ou falarem sobre o assunto em suas igrejas e famílias.


  1. ESTIGMA DA ESPIRITUALIZAÇÃO.

Este é um problema de caráter histórico visto que por muitos séculos, pessoas com transtornos mentais eram tratadas pelos seus familiares como potenciais endemoniados que precisavam de exorcismos, logo eram levados para a igreja que tratava tudo apenas pelo prisma espiritual e assim, muitos foram excomungados, jogados em manicômios e até mesmo mortos. Embora este tempo de obscuridade e ignorância tenha ficado para traz, ainda é comum que a pessoa que relata um transtorno mental, seja ansiedade, fobia, pânico ou outro qualquer, receba o diagnóstico espiritualizado antes de qualquer coisa, especialmente nos casos em que o transtorno reflete no comportamento da pessoa.

Certamente você já ouviu alguém na igreja, dizer de uma criança que não para quieta, que esse comportamento tem uma raiz espiritual. Ou ainda, de alguém que está muito quieta e desanimada, que ela está sofrendo opressão de algum espírito, ou pior, que alguém que tentou suicídio, estava sob alguma influência espiritual. Estes são apenas alguns exemplos de pessoas que podem estar sofrendo de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), Ansiedade e Depressão profunda, mas que no seio cristão tendem primeiro a ter seu problema espiritualizado, isto porque, espiritualizar as questões perturbadoras da vida para a grande maioria dos cristãos não é uma questão de maldade, descaso ou ignorância, é apenas a manifestação de um comportamento enraizado no cerne da fé cristã que foi alimentado por séculos e que se constitui em uma das principais características do sistema de crença evangélico.


2. DEBILIDADE ESPIRITUAL OU PREGUIÇA.

Um comportamento comum à maioria dos transtornos mentais é a indisposição. A pessoa sente-se exausta mentalmente e mesmo que não esteja fisicamente debilitada não tem forças para executar as tarefas mais básicas. Andrew Solomom em seu livro o Demônio do Meio Dia, relata como durante suas crises depressivas, a realização de tarefas simples, eram extremamente difíceis para ele, - “(...). As coisas mais simples exigiam um esforço colossal. Lembro-me de irromper em lágrimas porque o sabonete do chuveiro acabara. Chorava porque uma das teclas de meu computador prendera por um segundo. Eu achava tudo dolorosamente difícil e assim por exemplo, a perspectiva de tirar o fone do gancho parecia exigir o esforço de levantar 180 quilos. Ter de calçar não só um pé de meia, mas dois, e em seguida dois sapatos, esmagava-me tanto que eu tinha que voltar para a cama. (SOLOMOM, 2021, p. 83).


As palavras de Solomom, refletem a realidade de milhares de pessoas no mundo que sofrem com depressão, ansiedade, Burnout e outros problemas da mente. As pessoas acometidas por esses tipos de transtorno têm suas vidas sociais diretamente impactadas e os cristãos não estão fora dessa realidade. Assim, é comum encontrar cristãos, especialmente adolescentes e jovens apáticos, sem vontade, demonstrando um comportamento oposto à sua idade, muitos deles vítimas de várias formas de violência familiar, bullying, abusos etc, mas também, muitos homens e mulheres maduros e até mesmo líderes que outrora foram ativos, vitoriosos, verdadeiros modelos de funcionalidade, assumindo uma postura desanimada e desistida, devido algum tipo de trauma sofrido.


Neste tipo de situação o estigma se manifesta quando, antes de analisar a raiz do transtorno que está causando tal comportamento, a pessoa é enquadrada como alguém que está “fraco na fé”, esfiou espiritualmente, cometeu algum pecado e por isso não consegue mais se levantar. Sentenças do tipo – esse menino não ora, só fica trancado no quarto com o celular. – Você precisa jejuar mais, ou você não está lendo a bíblia como deveria, são as causas mais comuns diagnosticadas pelos arautos da fé. Geralmente, são receitadas campanhas de oração regadas a textos como: lembra de onde caíste e volta ao primeiro amor, quando na verdade, o amor dessa pessoa nunca esfriou, a fé nunca se perdeu, apenas a pessoa está emocionalmente ferida e desgastada precisando de ajuda.


3. ESTIGMA DA DEMONIZAÇÃO.

Outro aspecto comum às pessoas em sofrimento psíquico, são os pensamentos negativos que nos casos mais graves podem até chegar a idealizações suicidas. Falar sobre esses pensamentos é um grande desafio que muitas vezes exige anos de terapia. No seio cristão isto se torna ainda mais difícil, visto que, é praticamente inimaginável que alguém que tenha passado pela experiência do novo nascimento possa nutrir pensamentos negativos e até desejo de morte.


Imagine um líder de grupo de oração dizer que está sem dormir porque está com medo extremo. Ou, a ministra de louvor dizer que odeia o pai que foi abusivo em sua infância. O pastor falar que quer desistir de tudo e que não sente mais vontade de exercer o pastorado e até já pensou em suicídio. Por incrível que pareça, isto é mais comum do que se imagina e é a triste realidade de milhares de cristãos que estão sofrendo com estes pensamentos decorrentes de transtornos mentais, causados pelos mais variados fatores, perdas, traumas, traições, enfermidades entre outros tantos, mas que não tem coragem de falar aos seus pais ou aos seus líderes espirituais porque sentem medo de serem demonizados.


É prática comum no meio cristão atribuir os pensamentos negativos ao diabo. Tornou-se adágio popular: “mente vazia, oficina do diabo”. Sim, é sabido que ele se aproveita das nossas fragilidades e potencializa nossos medos, Joyce Mayer diz que o nosso maior campo de batalha é a mente. Mas isso não quer dizer que o fato de alguém ser cristão e ter pensamentos ruins seja sempre e simplesmente obra do maligno. Não se pode ignorar as diversas situações traumáticas que podem ocorrer na vida de uma pessoa mesmo sendo ela cristã, o próprio Jesus disse que no mundo teríamos aflições e nos estimula a ter bom animo. Porém, infelizmente a realidade não é essa e a prática mais comum é dizer àqueles que com muita dificuldade têm a coragem contar seus pensamentos que eles precisam “limpar suas mentes”, porque quem tem a mente de Cristo não pode pensar em se matar ou coisas do tipo. Isto só pode ser o diabo colocando coisas em sua cabeça.


Esse tipo de abordagem só dificulta a realidade dos cristãos que sofrem de transtornos mentais e infelizmente os índices de suicídios entre os cristãos atestam o quanto o tema ainda é mal compreendido na igreja e na família cristã.

É preciso romper com os estigmas e trazer luz a estes assuntos de maneira consciente. É fundamental que os pastores, líderes e os pais busquem conhecer melhor sobre os transtornos mentais a fim de identificar ainda que minimamente, os elementos que caracterizam alguém como portador de um transtorno mental ou espiritual.

Sabemos que essa é uma questão difícil e que não há como todos se tornarem especialistas no assunto, mas ao menos, pode-se tentar agir de uma maneira mais acolhedora, respeitosa e amorosa com aqueles que demonstram estar sob sofrimentos mentais.


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